A qualidade da amostra para o sucesso do teste molecular em tecido é crucial: mas seu papel não é só do patologista
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Com o avanço das técnicas de sequenciamento genético, como o NGS (Next-Generation Sequencing), a análise molecular se tornou uma ferramenta indispensável na prática oncológica. Hoje são numerosas as indicações de pesquisa de mutações, fusões ou de assinaturas moleculares dos tumores para guiar tratamento, diagnóstico ou informar prognóstico dos pacientes.
Na rotina de um laboratório de patologia molecular, a principal fonte de DNA ou RNA para realizar os testes moleculares dos tumores é o tecido fixado em formol e embebido em parafina (em inglês se utiliza sigla FFPE – ou aqui como falamos, o bloco de parafina). O sucesso dos testes moleculares depende diretamente da qualidade desse material biológico, que por sua vez depende de uma rede de cuidado envolvendo muitos profissionais, cada um responsável por um momento da jornada do tecido.
A jornada da amostra começa ainda no centro cirúrgico: o tempo entre a ligadura dos vasos sanguíneos e retirada da peça cirúrgica (isquemia quente), o tempo entre a retirada da amostra e a fixação do tecido (isquemia fria) — podem afetar significativamente a qualidade dos ácidos nucleicos e é importante que sejam o mais breve possível.
A fixação, etapa crítica da fase pré-analítica, deve ser feita utilizando a solução de formalina 10% tamponada e durar entre 6 até 48 horas para preservação da morfologia e integridade do DNA/RNA. O uso do formol inadequado dificultam a obtenção de DNA/RNA de qualidade e leva à testes inconclusivos. A amostra deve ser colocada em quantidade suficiente de solução fixadora, de pelo menos 10x o volume de solução para o tamanho da amostra.
Já no laboratório de patologia, a amostra passa por uma série de etapas de trabalho, como a macroscopia, processamento histológico e inclusão em parafina. Nessas etapas os laboratórios devem manter rigoroso padrão técnico de processos e qualidade de insumos para garantir a confecção do bloco de parafina contendo tecido com material genético preservado.
Para realização do teste molecular é necessário ainda garantir a adequada quantidade de amostra tumoral. Os requisitos de DNA/RNA são distintos entre os diferentes painéis de NGS, e é necessário uma revisão por um patologista ao microscopio para determinar a adequabilidade da amostra para o sequenciamento. Essa adequabilidade está relacionada à quantidade de tecido e à porcentagem de representação de tumor em relação à células não tumorais. Amostras muito pequenas, com muita necrose, mucina, pigmentos, calcificadas ou ainda em que as células tumorais estejam entremeadas à muitas células não neoplásicas (como por exemplo metástases linfonodais) podem ser um desafio para o teste molecular.
Portanto, não só o patologista desempenha papel essencial na jornada do tecido, mas também os profissionais presentes desde o momento da biópsia/cirurgia, fixação e encaminhamento da amostra ao laboratório de anatomia patológica. A atenção rigorosa aos detalhes técnicos de cada uma destas é o alicerce para uma medicina de precisão de sucesso.
Autora:
Mariana Petaccia de Macedo
CRM: 128350
Referências:
da Cunha, I.W., de Almeida Coudry, R., de Macedo, M.P. et al. A call to action: molecular pathology in Brazil. Surg Exp Pathol 4, 15 (2021). https://doi.org/10.1186/s42047-021-00096-1
Sociedade Brasileira de Patología. In: Assis E, editor. Manual de Boas Práticas em Patología; 2020. http://www.sbp.org.br/wb/wp-content/uploads/2020/09/ miolo-final-ebook-FINAL-COM-CORRECOES-23-09.pdf.